Muito se fala sobre médiuns e mediunidade, mas quase não se fala sobre uma das (se não a mais importante) figura dentro do terreiro: o Cambone, palavra de origem bantu derivada da palavra Kambondo, em kimbundo.
Basicamente, o Cambone é a pessoa responsável por assessorar o guia-espiritual durante as consultas e também ao médium, ajudando-o a arrumar seu ponto de trabalho e providenciando os apetrechos e ferramentas que o guia-espiritual geralmente necessita. Mas essa figura tem uma função ainda mais profunda e que vamos dialogar nas próximas linhas.
Todos os trabalhadores de Umbanda sejam médiuns de incorporação (rodantes em algumas vertentes), pais e mães-pequenos e os próprios dirigentes e ogãs, foram um dia Cambones. Se não foram, tem coisa errada aí e pode parar de ler agora.
Nos terreiros mais antigos a única forma de ingressar na corrente é se tornando um cambone. Nem mesmo quando o médium já vem preparado de outra casa, essa função lhe escapa. É sendo cambone que ele vai aprender os rituais da casa que está trabalhando, vai conhecer melhor as entidades que assistem aquela corrente e outras coisas mais. Então, por isso é que é importante ser Cambone, antes de começar a sair “sacudindo o corpo” por aí.
O cambone ainda tem uma função mais importante que é a fiscalização, por assim dizer, das atividades dos médiuns/entidades. Ele(a) irá se assegurar de registrar todas as recomendações dadas pelas entidades aos consulentes em um caderno de conduta, que cada médium deve possuir. Pelo menos é assim que fazemos em nossa casa, apesar de não ser uma prática comum em outros terreiros que já visitei. Nesse caderno o cambone anota o nome da pessoa, a data da consulta e as informações básicas do problema que a pessoa está passando e das mirongas e sugestões dadas pelos guias.
Além disto, o cambone deve ficar atento ao comportamento do médium e da entidade, para perceber se não há mudanças de padrões, se ele não começa a se comportar mais animicamente do que mediunicamente e também se o médium não está incorrendo em mistificações. Quando ele percebe alguma coisa estranha no comportamento médium/entidade, ele tem por obrigação de ir relatar ao Dirigente do terreiro, para que sejam tomadas as medidas necessárias. Quando um médium cai em desequilíbrio, ele não pode mais atender – teoricamente – então deve também passar por um processo de ajuda e reequilíbrio. Mas quem irá detectar isso é o Cambone.
Ainda mais, o cambone serve de intérprete das entidades para os consulentes. Muitos guias têm falas arrastadas e cheias de jargões que os consulentes de primeira-viagem não conhecem. Já os cambones pegam essas palavras e traduzem para o coloquial-informal, que estamos habituados. Isso já transmite a segurança pra consulencia sobre a consulta, além de ser um elo humano para o mesmo. Logo, podemos dizer que médium que dispensa cambone é porque está devendo algo ou está fazendo algo errado, então também se deve desconfiar.
O cambone, durante o trabalho com o guia-espiritual, começa a ser preparado para sentir as vibrações para que um dia também possa ser um médium de incorporação (consulta, rodante, etc). Muitas vezes os guias-espirituais os colocam para dar passes ou suporte energético, além de chamar algumas de suas entidades para se aproximarem do mesmo, com a finalidade do cambone começar a conhecer essa energia. A maioria dos cambones acaba se tornando médium de consulta, porém isso não é regra. Alguns serão sempre cambones, o que não diminui em nada suas responsabilidades e sua importância dentro do terreiro. Esses que não incorporam, possuem outras formas de mediunidades, geralmente intuitivas e inspiradas, que ainda assim servem de ferramenta para os trabalhos no terreiro.
Mas existe uma prática que é bem comum nos terreiros, que a meu ver é equivocada: Usar o cambone como médium de transporte. Nem todo cambone é um médium de transporte, mas falamos sobre isso em um artigo específico.
Os cambones como uma classe de trabalhadores dos terreiros de Umbanda, são de extrema importância, por tanto que eles possuem até um líder entre eles, para organizar esse trabalho por eles praticado, o chamado Cambone Maior. Essa função compreende várias atribuições, dentre elas a preparação e defumação da casa, o direcionamento dos demais cambones para os médiuns que irão assistir, o direcionamento da assistência para os pontos dos guias conforme vagam-se os pontos, geralmente são chamados pelas entidades para executarem algum trabalho externo ou quando precisam de algo de fora do terreiro, entre outras coisas mais.
Um conselho que é dado em nossa casa é que o cambone sempre rode os pontos, ou seja, mude de entidade sempre. Essa prática fará com que o cambone conheça diversas formas de trabalho diferentes e possa passar pelo “aporte energético” de várias entidades diferentes. Alguns se afeiçoam a um determinado médium ou guia, mas isso pode ser um erro. Como a função do cambone é de fiscalização, quando esse se afeiçoa demais a um guia, passa a não ter isenção. Acredita que se disser algo aos dirigentes estará expondo o médium e isso irá prejudica-lo. Mas de fato o que ocorre é o inverso, justamente por não apontar isso é que está deixando o médium entrar em um vórtice negativo e possivelmente compactuando com a queda deste. Então o cambone tem que ser firme e acima de tudo isento. Pode gostar do médium, pode gostar do guia, mas acima de tudo há a responsabilidade. E a responsabilidade é para com Deus e com o mestre Jesus.
Vejam só quantas coisas os cambones fazem e como são importante. Eu mesmo sinto muitas saudades de cambonear. Geralmente isso ocorre quando meus guias me permitem não incorporar, assim consigo matar um pouco dessa saudade de ouvir os guias e de servir ao terreiro de várias formas diferentes. Que possamos valorizar os cambones e que os cambones possam valorizar a sua IMPORTANTÍSSIMA função para a UMBANDA.
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